O que é mente criativa

O próprio ato de pensar nos dá a certeza da existência da mente. E onde há mente há criatividade. Mas ao contrário daquilo que costumamos imaginar, não somos apenas o que pensamos, sentimos e fazemos, em que pese a importância desses eventos em nossas vidas. Ou seja, se somos capazes de refletir sobre isso é porque somos dotados de algo mais. Esse algo mais é a mente consciente, aquilo que permite que olhemos para nós mesmos como objeto de análise e reflexão, o que os estudiosos do tema denominam de metapensamento. Outra evidência desse processo é a percepção de que criar é usar a mente consciente para gerar conhecimento.

Pode parecer paradoxal, mas a consciência que temos acerca de nós mesmos resulta da angústia existencial acumulada desde o amanhecer da humanidade. É a angústia acerca de nós mesmos que propicia a curiosidade pelo novo, o que nos leva a crer não há criatividade quando não há angústia.

O mecanismo mental que nos leva à criatividade ocorre por meio de dois componentes básicos: memória e consciência. Se tivéssemos o dom da consciência, mas não exercitássemos a memória, não sentiríamos a angústia que alimenta a vontade de conhecer. O drama humano passa pela angústia existencial que resulta da conjugação desses dois fatores, consciência e memória. Este é o paradoxo que propicia a busca pelo conhecimento e gera criatividade que se transforma em inovação.

A questão do conhecimento vem sendo debatida desde os filósofos da antiga Grécia e permanece até hoje. Segundo eles, o mundo não existe para ser plenamente conhecido até porque isso seria impossível dentro do estreito caminho da razão “a priori”. Portanto, não existe a possibilidade de um conhecimento pleno, nem acerca do mundo nem acerca da natureza humana. O que existe é a possibilidade de alcançar um conhecimento aproximado das ocorrências da vida por meio da utilização do instrumental científico disponível, da percepção aguçada propiciada por uma mente aberta e atenta, e da capacidade individual para o autoconhecimento.

O século XX se caracterizou pelo debate, quase histérico, entre os defensores da natureza (evolucionismo) e os defensores da criação (criacionismo). O embate natureza versus criação, a meu ver, não passa de um falso dilema. A natureza não prevalece sobre a criação e vice-versa. Há décadas a ciência vem debatendo a questão da evolução da espécie e do comportamento humano sob a ótica dessa falsa dicotomia, o que levou o conhecimento científico a impasses inúteis.

Sabemos hoje que o comportamento é parcialmente herdado por meio dos genes, mas isso só ocorre em circunstâncias específicas e sob certas influências ambientais, mesmo porque genética não é destino. Sabemos também que o cérebro humano vem se expandindo ao longo do tempo, visando uma adaptação necessária à complexidade da evolução biológica, cultural e social do homem. Sem essa expansão não seria dado ao homem criar, acumular conhecimento e utilizar idéias. E o homem não seria capaz de inventar atividades vitais à sua sobrevivência e evolução, tais como agricultura, linguagem, escrita, comércio, medicina e tecnologia. Isso nos leva a concluir que os genes não só registram e transmitem experiências e informações, como reagem a essas experiências. Assim, não existe o embate natureza versus criação, mas natureza e criação.

Watson e Skinner criaram, na psicologia, os pressupostos teóricos (empíricos) que afirmam que o homem de fato é uma tabula rasa, onde tudo pode ser inscrito. E que tudo no comportamento humano é produto das condições ambientais e de condicionamentos voluntários ou não. O mesmo conceito foi usado na sociologia por Émile Durkhein e na antropologia por Franz Boas, visando demonstrar que a mente é moldada pela sociedade e pela cultura, e não o contrário. Trata-se de um determinismo que reduz o homem a mero resultado de processos histórico-culturais. Segundo Durkhein, a causa determinante de um fato cultural deve ser buscada entre os fatos sociais que o precederam, e não entre os estados de consciência individuais. Para Boas, a cultura é um sistema de idéias e valores disseminado pela língua e outras formas de comportamento social, e não por aspectos de natureza individual. Ambos afirmam que o comportamento criativo advém apenas de processos sócio-culturais. Essa visão prevaleceu durante quase dois séculos, até o surgimento da chamada Era do Conhecimento, onde a tecnologia e a informação passaram a determinar tendências e sugerir novas formas de abordar a questão da criatividade e da inovação.

Então, qual seria o papel da mente na criatividade das pessoas? Para os adeptos do behaviorismo existem apenas seres humanos motivados por mentes que buscam permanecer na zona de conforto daquilo que já é conhecido, o que ocorre por meio de mecanismos de condicionamento. Assim, o comportamento criativo sempre é limitado pelas condições ambientais e sócio-culturais. Minha crença é outra, pois estou certo de que cabe ao homem agir intencionalmente para que suas potencialidades aflorem e a criatividade possa ser exercida, mesmo sob eventuais fatores condicionantes. Esse poder está no cérebro e na mente, e não no ambiente que nos cerca. Capacidade mental e cerebral, de um lado, e livre-arbítrio de outro, permitem a atitude individual para o comportamento criativo. As condições ambientais também influenciam, mas não determinam.

Ser criativo é extrair o que de melhor existe nesse mecanismo de trocas construtivas entre cérebro e mente consciente. Por isso o autoconhecimento é tão importante, porque é a partir dele que damos início ao processo de conscientização que abre as portas do nosso potencial criador.

Quando cientes de nossas potencialidades, utilizamos a mente e o cérebro para extrair o que há de melhor em nós, ou seja, nossos talentos. E assim transformamos criatividade em criação, e criação em inovação.

Portanto, caro leitor, use e abuse do potencial do cérebro e da mente, por meio do uso de ferramentas capazes de liberar a criatividade e produzir inovação. Quanto aos fatores sócio-culturais que possam atrapalhar o exercício da criatividade, simplesmente não dê atenção a eles.

 

José Diney Matos é consultor especialista em gestão de negócios e gestão de pessoas. É autor do livro Bem-Estar Criativo para o Sucesso.

Sobre jdineymatos
José Diney Matos é jornalista, escritor e conferencista. Pós-graduado em ciência e tecnologia e finanças, trabalhou como executivo em empresas de grande porte iniciando sua carreira no Unibanco e encerrando no Grupo Brascan. Há cerca de quinze anos vem atuando como consultor especialista em comportamento nas relações profissionais, gestão de carreiras e gestão de negócios. É fundador e atual presidente do IBEHI – Instituto Brasileiro de Estudos Humanísticos Integrados, entidade educativa associada à ACA – American Creativity Association, que se dedica a estudos e pesquisas sobre desenvolvimento humano, criatividade e qualidade de vida. É autor dos livros Artimanhas do Ego (2004), Bem-Estar Criativo (2006) e A Essencial Arte de Pensar (a ser publicado em 2011).

Deixe um comentário